A crise política na RDC: entre o passado e o presente

Independente desde 1960 da Bélgica, a RDC tem registado uma forte crise política que herdou momentos antes e depois da independência; 5 momentos marcaram essa crise.


1. 1960-1966 registou-se uma forte agitação quando nascia a primeira República, que teve início com a proclamação da independência nacional;

2. o assassinato do Primeiro-ministro Patrice Lumumba (1961), uma figura que continua ser discutida até hoje, (o parlamento Italiano apresentou no pretérito 18 de Outubro do corrente ano um livro sobre “Discurso Político” do Patrice Lumumba, escrito por Georges Nzongola-Ntalaj). Registou-se também neste mesmo ano a morte do Secretário Geral da ONU, Dag Hammarkjöld por acidente de aviação, as investigações continuam para serem apuradas as causas do acidente;

3. Registaram-se golpes de Estado de forma consecutiva entre o Mobuto e o Laurent-Désiré Kabila;

4. A morte dos dois líderes;

5. A guerra civil que se alastrou até hoje.

 

As consequências desta crise continuam a repercutir-se até hoje. Naturalmente, a guerra perpétua é uma dessas consequências, pois em 1997, essa intensificou-se nas províncias de Kivu Norte e Sul, do Leste para o Sul. Reataram-se as negociações com os rebeldes, que tiveram êxitos graças ao envolvimento da África do Sul, enquanto a morte de Mobutu fez com que o líder rebelde Laurent-Désiré Kabila fosse vencedor, ocupando deste modo Kinshasa e de consequência formalizou-se no poder.

Proclamando-se chefe de Estado, nomeou o governo de transição composto por 13 ministros, dois dos quais da UDPS (União pela Democracia e Progresso Social) presidida pelo Etienne Tshisekedi, um opositor das políticas adoptadas pelo Mobutu que viria a ser preso por proferir discursos políticos contrários ao governo no poder. Algumas medidas foram tomadas pelo Kabila, como:

  • A mudança do nome do país “Zaire” para RDC;
  • A convocação de uma Assembleia Constituinte;
  • Prometeu a realização das eleições legislativas e presidências até abril de 1999;
  • Proibiu todas as actividades políticas.

De facto, nada foi efectivado, porque os antigos aliados baniamulenges de Kabila, alegando que não tinham sido atendidas as suas exigências, deram prosseguimento ao conflito.

Post Kabila e a entrada no jogo do Kabila Jr. Em 2001 foi anunciado o assassinato de Laurent-Désiré Kabila, hipoteticamente por seu guarda-costas; Joseph Kabila, seu filho de 30 anos, outrora Comandante das tropas da infantaria, foi anunciado como Presidente ad interim da RDC; em 2002 foi celebrado o acordo de paz entre as facções rebeldes e foi estabelecido um Governo de união nacional de transição. Entre os dias 18 e 19 de Dezembro de 2005 foi realizado o Referendo que estabeleceu as eleições para 2006 (ele já governava o país há 5 anos), o qual foi aprovado por 84,31% dos eleitores e em Junho de 2006 o Joseph Kabila Jr. venceu as eleições, obtendo os 57% dos votos. Essas foram consideradas como as primeiras eleições gerais realizadas na história do país.

O segundo e o último mandato teve início em 2012, quando venceu as eleições legislativas realizadas em 2011, obtendo 49% de votos, contra 32% do veterano opositor Etienne Tshisekedi. Com este pleito eleitoral daria-se o fim do segundo mandato que a Constituição lhe confere.

Portanto, o que leva a Comissão eleitoral nacional independente a não convocar as eleições, uma vez que em Dezembro de 2016 terminaria oficialmente o segundo mandato do Presidente da República?

O artigo 70 da Constituição da RDC expressa que “o Presidente da República é eleito por sufrágio universal directo para um mandato de cinco anos apenas renovável uma vez”; o artigo 73 afirma que “o escrutínio para a eleição do Presidente da República é convocado pela Comissão eleitoral nacional independente noventa dias antes da expiração do mandato do Presidente em exercício”; e o artigo 75 afirma que “o Presidente do Senado assegura de forma interina a chefia do Estado em caso de morte ou de qualquer impedimento definitivo”

Baseando-se nestes postulados, surge mais uma outra questão, isto é, porque tencionam criar um outro referendo, se em 2015 foi realizado um que dava a possibilidade da realização das eleições gerais?

A sétima reunião de alto nível do Mecanismo Regional de Supervisão  do Acordo-Quadro para a Paz, Segurança e Cooperação  na República Democrática do Congo e Região dos Grandes Lagos (CIRGL) que teve início na capital Angolana (Luanda) no dia 26 de Outubro do corrente ano, onde participaram os  chefes de Estado e de Governo que fazem parte da CIRGL e membros das delegações das organizações internacionais, teve como tema a crise política na RDC, e Angola assumindo a presidência rotativa na CIRGL, era sua tarefa realizar essa reunião.

Mas se a reunião tinha como foco encontrar o meio-termo para a resolução da crise política na RDC, porque é que as parte envolvidas não foram convidadas (Governo e a oposição), a fim de fazerem parte da mesa das negociações do encontro que se realizou em Luanda?

Será que a SADC e a CIRGL sentem a necessidade da permanência no poder do Presidente Kabila Jr.?

Depois da morte de Kabila em 2002 o governo liderado pelo Kabila Jr. celebrara um tratado que estabelecia um governo de União Nacional de Transição e em 2005 foi realizado o referendo. Com a criação de um Governo de Unidade Nacional e de Transição  em 2016 para a preparação das eleições a serem realizadas apenas em abril de 2018, não se poderá de um certo modo criar um forte clima de tensões entre as partes, temendo que uma possa vir a violar os acordos e cair de novo nos incumprimentos do passado, isto é “realizar mais um referendo que possa dar o direito ao Presidente Kabila Jr. voltar a apresentar a sua candidatura”?

O clima político que se regista hoje na RDC tem como origem a não convocação das eleições por parte da Comissão eleitoral como manda o artigo 73 da Constituição da RDC, enquanto o Tribunal Constitucional não está desempenhando o papel que lhe cabe, e por último a UA, SADC e a CIRGL não estão a criar mecanismos que possam pressionar a Comissão eleitoral a fim de convocar as eleições, o que pode proporcionar um novo ciclo de tensão contínua entre o governo e as forças da oposição.

 

Dott. Adao Agostinho

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