Por que Angola precisa de Agências Nacionais ISBN e ISSN

Existe uma vontade política em ver universidades angolanas no ranking das melhores africanas. Em 2018, durante a visita ao campus universitário Agostinho Neto, o presidente João Lourenço desafiou a universidade angolana a constar entre as 10 melhores universidades do continente africano. Já no início de 2020, uma delegação liderada pelo reitor da Universidade Agostinho, Pedro Magalhães, participou, em Washington, na  Conferência Internacional de Administradores de Educação. Como e por que obter os códigos ISBN e ISSN nacionais?


   Embora a vontade política manifestada seja um sinal positivo do interesse das autoridades angolanas em ver as universidades do país a figurar no ranking das melhores africanas, acreditamos que a efectiva participação no ranking não deva ser entendida como um fim em si mesmo, aliás, a condição sine qua non para fazer-se parte da classificação não é o ranking em si, mas sim a existência e observância rigorosa de um conjunto de pressupostos de natureza científica, infra-estrutural, administrativa, humana, das liberdades académicas, do intercâmbio regional, africano e internacional que, ao estágio actual, Angola parece não reunir de todo.

 Comecemos pelos códigos ISBN e ISSN

   O ISBN – International Standard Book Number (Número de livro de padrão internacional) e ISSN – International Standard Serial Number (Número de série de padrão internacional) são códigos de que se compõem os livros e as publicações em série (revistas, jornais), respectivamente. E aqui, por se tratar da universidade, falar-se-ia de códigos para publicações de ensaios e revistas científicas.

   Embora pareçam um elemento irrelevante quer para as editoras existentes no mercado, quer para os autores angolanos para as quais publicam, os códigos ISBN e ISSN são indispensáveis à identificação, circulação, comercialização e acesso das investigações científicas produzidas num dado país da parte de consumidores e/ou peer reviewers e críticos das demais cadeias universitárias do mundo, quer sejam parceiras, quer sejam competidoras, contribuindo tanto para a aquisição da noção das obras publicadas, quanto para o alcance de prestígio e reconhecimento internacionais da produção científica de um dado sistema universitário, no caso o angolano.

   A identifiação de uma dada obra leterária científica, seu país de origem e a editora é subjacente nos 13 dígitos que compõem o código ISBN, que é dividio em 5 secções, isto é: um código prefixo de três dígitos que simboliza que se está em presença de um livro (geralmente é 978 ou 979), seguido de dois ou três números que representam o grupo linguístico, seguido de quatro ou cinco dígitos fixos que identificam a editora ou editor, seguem-se depois dois que identificam o título do livro e um número final, que pode ser zero ou não, tido como controlo da qualidade.

Editoras e/ou editores angolanos atribuem códigos ISBN não angolanos

   Salvo melhor informação, as editoras angolanas quer sejam de jure, quer sejam de facto, não atribuem códigos ISBN angolanos aos livros por si publicados de forma autónoma e automática, pois solicitam-nos à Agência Nacional Portuguesa de ISBN ou a do Brasil, que lhos atribui, o que, em certa medida, dilui a produção e publicação leterária e científica de autores angolanos na produção portuguesa ou brasileira, já que no circuito internacional, suas obras aparecem etiquetadas com códigos de editoras portuguesas ou brasileiras, ou se estiverem com códigos de editoras angolanas, o código linguístico (nº 989 para português) aparece gerido exclusivamente por Portugal, razão pela qual recorrem àquela agência para a obtenção do código. Porém, e como se lê no site da ISBN, Portugal atribui-os também a todos os demais PALOPs, com excepção do Brasil, que apesar de ser de expressão portuguesa, possui a sua Agência Nacional ISBN, com o cógido linguístico próprio (nº 85) no conjunto dos 13 dígitos.

   Para uma ilustração prática, vejamos duas obras científicas de dois autores angolanos. A obra Nação, Nacionalidade e Nacionalismo em Angola, de Patrício Batsikama, publicada pela Editora Mayamba, tem como código ISBN 978-989-7610-87-5, mais detalhamente, 978 (prefixo do livro), 989(grupo linguístico português, excepto Brasil), 7610 (código da editora, potencialmente a Mayamba), 87 (título da obra), 5 (controlo da qualidade). Já a obra Racismo, O Machado Afiado em Angola, de Domingos da Cruz, publicada pela portuguesa Exclusivo Edições, tem como código ISBN 978-989-8325-62-4. No primeiro caso, o código é atribuído pela Agência Portuguesa ISBN a uma editora e escritor angolanos, e no segundo, o livro é  português (em termos de códigos e editora), não obstante escrito por angolano.

   Além do exemplo do Brasil, que possui a sua própria Agência ISBN, esistem igualmente em África vários países com agências nacionais ISBN, como é o caso da Namíbia, a RD Congo, a África do Sul, a Nigeria e a quase totalidade de países africanos que se exprimem (também) em inglês, que atribuem em autonomia códigos para as suas publicacões leterárias, o que pode ter efeitos positivos na certificação e identifiação das suas produções no circuito comercial e académico internacionais, e na sua melhor participação no ranking das melhores universidades africanas.

Como obter os códigos ISBN e ISSN angolanos

   Contrariamente ao ISBN, o ISSN é composto de 8 dígitos, essenciais para evitar ambiguidades na catalogação de publicações de periódicos, jornais, revistas, websites ou qualquer outra publicação em série, tanto imprensa ou digital, mas ambos ISBN e ISSN são estabelecidos pela ISO – International Standard Organization (Organização International de Padrão), e Angola é apenas Estado membro observador (Correspondent member) desta organização, através da afiliação do IANORQ (Instituto Angolano de Normalização e Qualidade).

   De acordo com o site da ISO, “Correspondent members observe the development of ISO standards and strategy by attending ISO technical and policy meetings as observers. Correspondent members that are national entities sell and adopt ISO International Standards nationally”, isto é,  “Os membros correspondentes observam o desenvolvimento dos padrões e estratégias participando de reuniões técnicas e políticas da ISO como observadores. Membros correspondentes que são entidades nacionais vendem e adoptam as Normas Internacionais ISO nacionalmente”. É nessa condicão de entidade nacional que o IANORQ conta com a padronização ISO para produtos essencialmente bio-químicos, médodos microbiológicos, bio-químicos e físicos, bem como para a qualidade de sistemas.

   Por conseguinte, por se um órgão público sob a alçada do Ministério da Indústria, que vela pela actuação da política nacional de qualidade conforme o Decreto Presidencial N. º103/15 de 12 de Maio, é nosso entender que o IANORQ pode, em primeira instância, requerer a ISO o estabelecimento da primeira Agência ISBN no país, pois, de acordo com o site ISBN STANDARD, ISBN é publicada e atribuída pela ISO.

   Relativamente ao ISSN International Center, Angola não é sequer membro observador desta organização international, pelo que questiona-se de onde vêm os códigos ISSN que os jornais e revistas nacionais apresentam, ou então, se não os houver, aqui estaria a razão pela qual não os exibem, e nem sequer os podem colocar no circuito comercial internacional, pois Angola não é Estado membro, e como tal não possui um Centro Nacional ISSN que teria a missão de atribuir tais códidos às publicações em série no país e evitar ambiguidades no circuito comercial e académico. De acordo com ISSN Internacional Center, para que um Estado obtenha um Centro Nacional ISSN deve aderir a organização e observar os devidos requisitos e procedimentos, sendo um dos quais a ratificação dos Estatutos em comum acordo com a UNESCO e a França, enquanto sede da ISSN.

 A importância de ISBN e ISSN atribuídos localmente

   Uma vez estabelecidas quer a Agência Nacional ISBN, quer o Centro Nacional ISSN no país, as editoras e demais publicações privadas, públicas e sobretudo universitárias, passariam a solicitar seus respectivocs códidos ISBN e ISSN às mesmas localmente, economizando tempo e maximizando a eficácia e eficiência aos cultores académicos. No caso do ISBN, Angola passaria naturalmente a contar com um códido linguístico próprio à semelhança do Brasil, e salvaguardar, igualmente, os interesses de Angola no que diz respeito a identificação da sua produção científica de maneira autonóma no circuito internacional, bem como aumentar a visibiliade internacional dos seus autores e editoras de maneira eficaz, o que terá efeitos positivos na valorização da produção, acesso e consumo ao nível da academia angolana e estrangeira.

   Portanto, num segunda instância, se o IANORQ não tivesse a competência ou a vontade para solicitar o estabelecimento no país da Agência Nacional ISBN e do Centro Nacional ISSN, seria de esperar que órgãos superiores do Estado, poder executivo ou legislativo, tomassem a peito o dossier, para que Angola passe a atribuir de maneira independente os respectivos códigos aos cultores do saber como o fazem os demais países do mundo, incluindo da SADC, com efeitos positivos na materialização da vontade política e na observância gradual dos pressupostos para colocar universidades angolanas no ranking africano.

Issau Agostinho

 

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